quarta-feira, 1 de maio de 2013
Rabiscando a persona
Esse texto foi escrito a pedido da Psicanalista Anna Oliveira para uma curadoria do filme de Bergman, Persona.
As impressões são pessoais e baseadas também em inúmeras entrevistas que assisti do próprio autor.
As impressões são pessoais e baseadas também em inúmeras entrevistas que assisti do próprio autor.
Bergman por definição é sempre brilhante por simplicidade, me explico, o artista é aquele que consegue causar reflexão, no entanto, faz isso de forma sempre despretensiosa, autobiográfica e por isso apaixonante e desmistificada, desnuda do desejo de comover, deixa para os atores essa pretensão, ele enquanto artista, apenas se mostra.
Sempre tive um amor cativo por Bergman, sua genialidade prende, mas nunca havia visto nada da pessoa dele, a tranquilidade que demonstra, se contrapõe com aquilo que materializa, tem desejo por chuvas de verão intermináveis e obsessão por horários rígidos, oscilava quando criança entre a realidade e o sonho e, misturar tudo o isso o tornou inquietantemente acessível.
Persona é vivência do autor, aquilo que o habita, desvelando de forma magistral o que está contido em nós, em alguns momentos nossa histeria, como a de Alma, em tantos outros a paz como a de Elizabeth Vogler, costuradas de forma brilhante e cheias de pontas a serem puxadas, tal qual as sinapses.
Alma e Elizabeth somos nós, divididas apenas para se tornar visível ambos os lados da nossa personalidade, aquelas são os múltiplos ângulos do próprio autor, tentando ser transparente, acalmando nossas questões, incitando a pensar sobre nossas polaridades de maneira natural, quase afirmando que a histeria nos habita tal qual a paz.
Vogler silencia por renúncia a violência que considera ser a vida em sociedade, tal ponto fica claro quando se mostram as cenas reais do monge budista queimando vivo, ou da criança na segunda guerra mundial, ou ao final quando descobrimos sua inabilidade a maternidade, traço reprovável em sociedade, mas absolutamente possível.
No entanto, escolher uma vida silente, abnegada de convívio, trouxe paz, uma paz para tantos tão misteriosa que, seria possível uma tese de mestrado, na minha humilde opinião era apenas o seu nirvana, sendo desnecessária qualquer análise.
Em contrapartida, nossa histeria, Alma despe sem pudores o seu lado sombrio, seus medos e inseguranças, um desejo quase infantil como o que revela por trás do discurso projetado sobre Vogler, quando lê a carta, quando se vinga deixando o caco de vidro no chão, ou quando briga de forma descontrolada por não ter sua vontade saciada.
Quando nos olhamos por esse prisma, sentimos conforto, a humanidade é assim, infinita, um livro de questões intermináveis, algumas vezes é preciso silêncio para acalmar, outras tantas, uma boa dose de histeria para edificar, mas acima de tudo isso, ser capaz de empreender essa busca por si mesmo, sem perder a paixão, isto é arte, isto é o filme.
Para finalizar, termino com uma frase de Bergman em uma de suas entrevistas: “Eu nunca pedi que entendesse, pedi apenas que sentisse”
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