Me lembro bem de alguns anos atrás quando li "O artista da fome" do Kafka, foi um murro no estômago.
Vivendo agora um abismo emocional que tenho cultivado há anos nessa busca tão sem ineditismo em meio a de todos no mundo, me pergunto sempre porque não há paz e me lembro de uma teoria que tinha quando criança apelidada anos depois de teoria da proximidade, onde tudo deveria ser o mais próximo, o trabalho deveria ser mais próximo de casa, assim não brigaríamos pela passagem do ônibus, ou a má qualidade, as pessoas com idéias mais próximas deveriam conviver, assim ninguém precisaria se magoar ou chorar e assim vai, uma infinidade de coisas próximas que talvez caíssem em um imenso mar de comodismo, mas partindo sempre do princípio de que a briga dói mais que a paz.
Hoje ainda me pego pensando em sendo observadora do artista da fome, me vejo exatamente no mesmo lugar, eu ficaria calada, sentaria ali pra observá-lo depois partiria, talvez voltasse mais vezes e quem sabe talvez perguntaria qual era o objetivo dele, não para emitir opinião, apenas para entender e me prestaria ao papel que ele desejasse, escrevo isso e me dá vontade de chorar, porque é muito simples agredi-lo, ou me vestir de gostosa para ajudá-lo a sair da jaula a cada 40 dias, ou vender souvenir do artista da fome, é muito simples interferir na vida dele sem qualquer objetivo, mas é inconcebível apenas entender que ele nunca conseguiu encontrar nada para comer que gostasse e permanecer com o cérebro vazio.
Entendo não gostar de nada pra comer, entendo ser gostosa, assaltante, padre, eu entendo tudo isso, mas não assimilo a opinião. É sobrehumano compreender como alguém tenta imprimir a própria vivência na vida do outro, supondo o que deva ser o correto. O seu correto, não é o meu e pronto. Aperta minha mão aqui e vamos em frente, em silêncio, sem precisar agredir, julgar, opinar, nem fingir que não estamos fazendo nada disso, porque se você ouvisse o que sai da sua boca nessa hora, entenderia que está julgando, opinando ou tentando interferir.
Sempre achei que o brasileiro tivesse jeito pra tudo, aprendemos uma nova modalidade, o jeito pra reclamar, todo mundo reclamando, mas mudando muito pouco. O mundo sofre de misantropia, sofre de estrangulamento da personalidade, sofre, mas alguns ainda conseguem aparentemente dar voz aquilo que querem e seguir em frente, mesmo sentindo solidão.
Eu sofro de cansaço, de encolhimento, sofro de uma doença chamada opressão, fui uma esponja de opiniões desde que nasci, absorvi todas elas, boas e ruins, hoje peso mil quilos e não sei qual opinião me desfazer primeiro, porque todas elas foram importantes para alguém despejá-las em mim, sou uma artista da gula, comi tudo aquilo que quiseram me dar, mas qual é a minha opinião?
Não ouso derramá-las em vocês, afinal, tudo é importante de mais para derramar assim...